sábado, 24 de janeiro de 2009

ERASMO DE ROTTERDAM, Desidério [1466-1536]. Sobre o livre-arbítrio [1524]


[1] Atenhamo-nos à solução intermediária: existem, sim, obras boas, mesmo que imperfeitas, e das quais o homem pode valer-se sem fazer delas motivo para ensoberbecer-se; existe, sim, algum merecimento, mas é preciso reconhecer que, se foi conquistado, isso se deve a Deus. Quem sabe fazer um exame de consciência terá de abdicar de qualquer pretensão de arrogância ao dar-se conta do quanto a vida humana está cheia de fraquezas, vícios e delitos, mas não iremos tão longe a ponto de dizer que o homem, mesmo se justificado, não é mais que um cúmulo de pecados, quando o próprio Cristo nos fala de um novo nascimento e Paulo, de uma nova criatura.
[2] Mas por que conceder um espaço ao livre-arbítrio? Para ter algo a imputar justamente aos ímpios que voluntariamente se desviaram, escondendo-se da graça divina, para afastar de Deus qualquer acusação caluniosa de crueldade ou injustiça, para afastar de nós o desespero ou a presunção, para impulsionar-nos em direção ao empenho.
[3] Essas são as razões que levaram quase todos os autores a admitir o livre-arbítrio; mas o livre-arbítrio continuaria ineficaz sem a contínua ajuda da graça de Deus, que é exatamente o que nos impede qualquer forma de orgulho.
[4] Mas ainda se poderá dizer: para que serve o livre-arbítrio, se ele nada pode fazer sozinho? Responderei: para que serviria o homem, se Deus fizesse com ele como faz o oleiro com a argila, ou se Deus procedesse com ele da mesma forma que procede com uma pedrinha?
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Triângulo de Platão - BLOG DO PROF. EDSON GIL
http://edsongil.wordpress.com/2007/08/28/erasmo-2/

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